domingo, 13 de julho de 2014

Nem todas as vezes

promessas e apostas. não cumpridas as primeiras e perdidas as segundas.
Com os olhos ainda embotados de cimento e sono, achar a faca por entre os talheres e se resignar. Observar a gordura branca que se funde com a carne branca. E o boi. O boi ali na minha frente. Houve um tempo em minha infância em que eu acreditava. Houve um tempo em que eu não comia carne. Eu até acreditava. Acreditava. Eu rezava à noite, enquanto os outros dormiam. E eu imaginava o dia em que ficaria sozinho neste mundo. Mas eu ainda assim acreditava. Acreditava em tudo. Na areia que escorria por entre minhas mãos enquanto observava o mar. Nas coisas que aprendia na escola. Nos cartazes que lia no centro da cidade. Todas as coisas pareciam correr para o mesmo canto.
E quem imaginaria que dez anos depois eu me sentiria mais vivo cortando bifes de uma peça de carne de três quilos?
A faca vazia de sentido escorrendo pelo sangue escondido por entre os sulcos visíveis a olho nu. Nada poderia me abalar.
Essa tosse seca que me incomoda há duas semanas não poderia me incomodar jamais. O medo ainda infantil de que talvez seja uma pneumonia ou algo parecido, mesmo que eu não saiba se os sintomas condizem. O fato de que hoje no almoço não vai ter suco. Dali há alguns minutos irei pegar o copo de vidro meticulosamente planejado pela ciência do design e despejar algumas mls de água para empurrar a espécie de macarronada. A falta de tempero completo no armário e a ausência da minha mãe. Nada me abala mais. Há tempos que não há tempero nem mãe. Há tempos que a ciência do design vai ganhando espaço na classe média baixa. Há tempos que a classe média é composta de pessoas tristes.
Eu poderia não ter enrolado tanto para falar dos teus olhos. Esses meio imaculados, meio protegidos por uma aura divina que não cansa de me proteger. Mas tudo está ligado, como diz você. O fato de eu estar cortando bifes para 3 pessoas e você ser vegetariana. O fato de que eu odeio médicos e sua hipocondria. O fato de eu não acreditar mais nem na areia da praia que supostamente se esvai das minhas mãos enquanto o sol se põe e você acreditar que o barulho do mar é a coisa mais tranquilizante do universo.
Não, não acredito mais no amor. Não acredito que um homem possa amar uma mulher e que estes possam viver felizes para sempre. Mas no fim das contas, acho que algo parecido com isso entre eu e você não duraria muito. Acho que você deve saber masturbar um homem muito bem, apesar de não saber ainda deste fato. Acho que no momento peculiar em que o rapaz gozar, você meterá a boca lá e engolirá tudo com a sede de um sobrevivente de uma catástrofe natural. Mas não desejo ser esse cara. Hahaha. Acho que você daria um apelido para o meu pênis.
Você, que odeia minhas contradições, não acreditaria se eu te dissesse essas coisas. Nem acompanharia a falta de padrão dos meus pensamentos. Mas seus olhos não deixam de ser o par de conjuntos de células e sistemas biológicos mais bonitos que eu já vi.
A diferença entre mim e um homem apaixonado é que ele está disposto a viver por sua paixão. E por você eu estou disposto a morrer. Ou até a encontrar um significado para a nossa existência que te convença a suicidar-se comigo. Mas se eu descobrisse o sentido disso tudo, ou mesmo tivesse uma prova cabal de que não faz sentido, se deus chegasse em meu ouvido e dissesse que tudo isso que a gente faz não tem significado nenhum, eu não te diria. O sorriso que tua fé te dá eu jamais poderia dar. Nem ao menos pra mim mesmo. E eu acho que nunca terei isso. Nem a fé nem o sorriso.

sei lá

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